1 de agosto de 2015

Neves...

Oi amiguinhxs, estou assistindo no canal Curta! ao documentário Tancredo Neves - Uma Travessia, feito em 2010. 
O filme todo fala sobre democracia, sobre estado de direito, enaltecendo a figura de Tancredo desde os tempos de Getúlio Vargas, passando pelos bastidores do golpe militar de 1964, mas focando na campanha pelas eleições livres e diretas.

Não consigo me conter: aqui estou.

Desde o fim da penúltima ditadura no Brasil (o Estado Novo) até o golpe de 1964, houve quase 20 anos de democracia; a chamada Quarta República, onde felizmente os eleitores eram quem escolhiam por meio do voto quem iria presidir o país.

Naquela época o vice-presidente era eleito também, isto é, havia os candidatos à presidência e os candidatos a vice, candidatados e eleitos separadamente.

Mas esses não foram anos fáceis, pois os três presidentes e os três vices eleitos nesse período sofreram pressão e (tentativas de) golpe por parte das mesmas forças reacionárias.

Primeiro foi o próprio Getúlio Vargas, que, apesar de seu passado autoritário, promoveu reformas progressistas e então se retirou encerrando sua ditadura. Depois de se candidatar e ter sido eleito legitimamente, não conseguiu terminar seu mandato (se suicidou), por conta da pesada campanha vil e achacadora liderada pelo jornalista e político Carlos Lacerda e pelos militares reacionários (dentre eles alguns dos próprios generais de Getúlio).

O vice de Getúlio, Café Filho, assumiu mas também não aguentou até o fim do mandato (por motivos de saúde). 
Então quem assumiu foi o presidente da câmera, Carlos Luz, aliado aos militares que maquinavam um golpe que impediria a posse dos recém-eleitos Juscelino Kubitschek (presidente) e o trabalhista e progressista João Goulart (vice).
Graças ao general Lott (um dos grandes militares brasileiros, dos poucos militares de alta patente defensores da democracia), o golpe não vingou e Juscelino tomou posse.

Em 1960 Jânio Quadros foi eleito presidente e João Goulart foi eleito vice-presidente mais uma vez. Em 1961 Jânio renunciou, por conta da pressão das famosas "forças ocultas", que de ocultas mesmo não tinham nada, era o conservadorismo das forças reacionárias.
O vice João Goulart, disposto a realizar reformas progressistas que visavam a melhoria de vida de milhões de brasileiros desfavorecidos, despertou a ira dos reacionários, que maquinavam outro golpe. Quem eram esses reacionários? Opa, é fácil dizer: grande mídia/imprensa, banqueiros e as elites brasileira e norte-americana, encabeçados pelos militares.

Tancredo, dentre outros, então costura uma solução "intermediária" com os golpistas: mudar o sistema de governo do Brasil para o parlamentarismo (claro, sem consultar os eleitores). Então Goulart conseguiu assumir como presidente mas na prática quem comandava mesmo era o primeiro-ministro. E quem foi o primeiro-ministro? Tancredo Neves.

Esses mesmos golpistas que impediram João Goulart de governar o país, em 1964 colocaram em prática o golpe, com invasões armadas, forçando assim o presidente a deixar o palácio de governo (Goulart foi para Porto Alegre).
Quem então anunciou a deposição do presidente Goulart? O então presidente da câmera. Inclusive alegando que os militares iriam assumir o governo do país porque o presidente Goulart teria abandonado seus encargos (obviamente ignorando o fato das invasões armadas atentando contra a vida do presidente e contrariando a lei, que era clara ao afirmar que o abandono só poderia ser caracterizado no caso do presidente deixar o país).

Depois o filme sobre Tancredo deixa de contar sobre as manobras de manipulação que a ditadura usava em conjunto com a grande imprensa e demais setores conservadores, para domar a opinião pública; deixa de contar sobre os inúmeros casos de corrupção e retrocesso nas questões sociais (a tal modernização pregada pela ditadura militar nada mais era que o aumento exponencial das diferenças sociais); e principalmente, deixa de contar sobre como a ditadura militar perseguiu, torturou e assassinou quem quer que ousasse optar pelo embate para combater a ditadura e lutar pelo retorno da democracia.

O filme termina focando na campanha Diretas Já e no calvário que culminou na morte de Tancredo.

Quanto à figura de Tancredo, por vezes reconheço seu caráter conciliador e sua importância na defesa da democracia, e por vezes acabo desconfiando de alguns fatos e episódios... Como por exemplo a promoção do futuro ditador Castelo Branco a General do Estado-Maior por indicação de Tancredo (fato esse inclusive abordado no filme).
Mas a trajetória dos Neves que vieram depois de Tancredo não deixa dúvidas, de como o Brasil piorou em termos de Neves na arena política do país, puta merda.

Foi surreal ver ali no filme o neto Aécio depondo emocionado sobre a luta do avô Tancredo em prol da democracia, ainda mais num momento como o presente, onde Aécio é um dos políticos de liderança no movimento golpista que tenta derrubar a presidenta eleita Dilma Rousseff.

Vendo o filme e pensando na história recente do Brasil, algumas coisas que de tempos em tempos se repetem me deixam perplexo:
1. Apesar de muitos bradarem o contrário, a maioria dos eleitores brasileiros quer as reformas progressistas, quer o combate à desigualdade social, quer o combate efetivo à corrupção, tanto é que continua elegendo os candidatos comprometidos com essas causas;
2. As forças reacionárias usam a grande mídia/imprensa para denegrir a imagem de quem se compromete com essas causas, as forças reacionárias usam o discurso de ódio e simulam uma cruzada pelos bons costumes e caça às bruxas, mas são as forças reacionárias que se recusam a serem submetidos à lei e não hesitam em maquinar golpes.

O fato de em grande parte dos golpes ser o presidente da câmera o portador da desgraça, e de termos hoje como presidente da câmera o nefasto Cunha, me causa arrepios de náusea.
O fato de pessoas com um passado de aparente luta em prol da democracia hoje fazerem apologia de golpe contra a presidenta eleita Dilma, como Aécio Neves e Aloísio Nunes (dentre outros), me causa arrepios de náusea.

Mas o pior mesmo é perceber que tem muita gente pobre que sente fascínio pela causa reacionária, abraçando as ideias propagadas pela campanha de ódio e denegrindo o governo federal do PT, eleito, legítimo. Enquanto isso o governo do estado de SP do PSDB, por exemplo, segue poupado...

Eu discordo de muitas posições dos governos do PT, assim como dos governos do PSDB e de todos os outros partidos, assim como discordo de muitas das posições tomadas pelos governos passados dos mais variados partidos.

Não se trata de defender o PT ou o PSDB, o que eu defendo é o estado de direito, eu defendo é a legalidade (a busca por leis justas e evolutivas e pelo cumprimento delas), eu defendo é o combate à desigualdade social e o combate à corrupção de quem quer que seja, eu defendo é a democracia.

Acho que se Tancredo pudesse ver o que seu neto está aprontando, estaria muito triste agora.